Reunião na FIEPA discute impactos das tarifas norte-americanas sobre a cadeia do açaí paraense
- marialuiza9513
- há 5 dias
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No auge da safra, a produção de açaí no Pará pode movimentar de R$ 15 a R$ 20 milhões diariamente em algumas localidades do Estado. São aproximadamente 250 mil latas produzidas por dia, gerando um ciclo virtuoso de emprego, renda e desenvolvimento regional que beneficia diretamente comunidades ribeirinhas, barqueiros, carregadores e milhares de famílias que vivem da coleta, transporte e beneficiamento do fruto.
Para discutir os riscos a esse fluxo econômico e social, a Federação das Indústrias do Estado do Pará (FIEPA) reuniu, na quinta-feira (7), empresários do setor industrial do açaí paraense em um encontro que teve como foco o atual cenário das exportações da polpa e de seus derivados. A reunião trouxe à tona dados estratégicos, levantados pelo Centro Internacional de Negócios da FIEPA e pelo Observatório da Indústria do Pará, além de preocupações crescentes com os impactos da taxação imposta pelos Estados Unidos aos produtos brasileiros.
Apesar da crescente diversificação de mercados, os Estados Unidos permanecem como o principal destino das exportações paraenses de açaí, representando atualmente cerca de 75,40% do total exportado. No primeiro semestre de 2025, as exportações para o mercado norte-americano somaram mais de US$ 43,6 milhões, com um crescimento de 59,34% em relação ao mesmo período do ano anterior, conforme os dados do FIEPA CIN.
No entanto, a recente exclusão do açaí da lista de isenções tarifárias anunciada pelo governo norte-americano gera forte apreensão no setor. Estima-se que o impacto direto sobre o volume exportado pelo Pará aos EUA possa chegar a 20,1%, sendo 8% apenas sobre o açaí.
Cadeia ameaçada
O chamado “tarifaço” afeta uma cadeia produtiva que, segundo o levantamento da FIEPA, gera cerca de cinco mil empregos diretos e 15 mil indiretos apenas na indústria, sem contar os milhares de trabalhadores envolvidos nas etapas de coleta, transporte e beneficiamento do fruto na floresta.
Para o presidente da FIEPA, Alex Carvalho, o impacto ultrapassa os limites comerciais e representa uma ameaça real ao modelo de desenvolvimento sustentável construído ao longo dos anos na Amazônia.
“Essa medida compromete empregos, reduz a produtividade e afeta diretamente a sustentabilidade econômica de milhares de famílias da Amazônia, principalmente aquelas que dependem da colheita e processamento do fruto para sobreviver. Precisamos buscar alternativas diplomáticas e preparar medidas mitigadoras em todos os níveis para proteger essa cadeia produtiva, que já é historicamente vulnerável e que tem papel fundamental no desenvolvimento sustentável da nossa região”, defendeu.
Impactos em uma cadeia de produção linear
Empresário do ramo, André Lima destacou a importância estratégica do fruto para a economia das comunidades ribeirinhas e para o sustento de milhares de famílias da Amazônia.
“Estamos falando de um produto que representa saúde e qualidade de vida, mas que também democratiza a renda. O dinheiro circula na base, chega ao ribeirinho, ao barqueiro, ao carregador de fruto. É uma cadeia com impacto direto em quem mais precisa. Por isso, não pode haver ruídos nessa operação”, afirmou.
André ainda explicou que sua empresa é completamente voltada à exportação e que 90% do faturamento vem do mercado americano, o que torna o impacto da nova política tarifária ainda mais significativo. Segundo ele, o açaí é hoje um produto com alto valor agregado, vendido, em média, por US$ 12 o pote de 500ml nos EUA, mas cuja competitividade pode ser comprometida com o aumento das tarifas.
“O consumidor americano consome o açaí como refeição, como pré ou pós-treino. Mas com aumento de preços, ele pode passar a buscar opções mais baratas de alimento. Isso nos preocupa muito, porque o açaí pode deixar de estar na mesa de muitas pessoas”, completou.
Setor destaca estratégia nacional
Para a presidente do Sindfrutas Pará, Denise Martins, o momento exige uma resposta coordenada que vá além da lógica setorial. Segundo ela, o Brasil precisa olhar para a bioeconomia amazônica com uma visão estratégica.
“O açaí não é só um produto agrícola, é a segunda pauta de exportação paraense, um produto da bioeconomia da Amazônia, uma ferramenta ímpar de distribuição de renda às comunidades ribeirinhas no interior. Ele mantém a floresta em pé, movimenta comunidades inteiras e projeta o Brasil no mundo como um país capaz de conciliar produção e sustentabilidade. Por isso, não é razoável que, diante de uma medida externa com potencial de desestabilizar todo esse modelo, não tenhamos ainda uma agenda nacional clara de proteção à bioeconomia amazônica”, afirmou.
Além de afetar a cadeia econômica do Pará, a medida adotada pelos EUA tende a impactar também o próprio consumidor americano. O aumento das tarifas deve se refletir no preço final do produto, tornando-o menos acessível em um mercado que valoriza cada vez mais alimentos saudáveis, naturais e sustentáveis.
No Brasil, por outro lado, ainda que o consumo interno do açaí tenha crescido, os preços praticados no mercado nacional, em reais, não compensam a perda de receitas em dólares no mercado externo, onde o valor agregado é substancialmente maior.